quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Opinião "Possuída pelo Passado"

O passado faz parte do curso da vida, assim como as pessoas que fizeram parte dele. Se por um lado temos as pessoas que perdemos com o tempo e a distância, por outro temos aquelas que a morte levou e que por mais que queiramos não podemos voltar a ver.
Ou será que podemos?


Quando coloquei os olhos na sinopse deste livro, tive um vislumbre de dois episódios de Black Mirror sobre a temática de vida após a morte e até onde estamos dispostos a ir para manter as pessoas que amamos presentes na nossa vida.
No entanto, as minhas expectativas em nada foram cumpridas porque "Possuída por o Passado" não é bem sobre a vida após a morte mas sim sobre a possibilidade de alcançar quem está do outro lado e o quanto essa ligação nos pode transtornar, impedir de avançar ou mudar a nossa vida para todo o sempre.

Eurydice (Edie) trabalha como Corpo na Sociedade Elisiana. Num presente não muito diferente do nosso, Edie fornece um serviço que permite aos seus clientes conectarem-se com os seus entes queridos. Um objecto pessoal da pessoa falecida e um comprimido com a dose necessária para a apagar e ser substituída, é tudo o que é necessário para se criarem pontes entre este mundo e o outro.
Arrepiante, deixem que vos diga, especialmente porque Edie desaparece por completo durante essas sessões, deixando o seu corpo à mercê da dupla cliente/visitante e deixando-nos a nós leitores completamente no escuro sobre o que acontece nos minutos em que ela não está presente.


Mas se ao longo dos anos Edie tem vivido como uma sombra, quase em piloto automático entre a sua vida despretensiosa e as possessões dos entes queridos dos seus clientes, tudo muda quando Patrick Braddock visita a Sociedade Elisiana com o desejo de falar com a sua falecida esposa Sylvia.
Um batom vermelho, uns quantos instantâneos de uma vida conjugal feliz, um viúvo atraente e uma mulher que começa a pensar que a sua existência merece algo mais do que de momento tem.
Depois de tantos anos sem uma vida a que chamar sua, será errado querer a de outra pessoa?
Mas que segredos esconde a morte de Sylvia? Será Patrick apenas um esposo de luto?
E Edie? Que segredos a fizeram escolher ser um Corpo? O que motiva a sua alienação em prole da possessão dos entes queridos dos seus clientes, mas em especial, de Sylvia?
E o que dizer da Sociedade Elisiana e dos seus Corpos? 

Confesso que o tema ainda me deu pesadelos. A ideia de ser um receptáculo para outra pessoa, ter a sua consciência a preencher as frestas da minha mente e a sua vontade a comandar o meu corpo. NOP! Demasiado arrepiante!
Mas pesadelos à parte, posso dizer que "Possuída pelo passado" não é um livro para encarar de animo leve. É preciso estofo para o ler e para embarcar no mistério em volta da personagem que Sylvia foi até à tua inesperada morte, na aura de pesar e culpa que rodeia Patrick e no efeito esponja do vazio que habita em Edie.
É com toda a certeza um livro que nos faz pensar, quer na possibilidade de contactar quem perdermos, quer na anulação pessoal resultante da dor.
No entanto, talvez eu não estivesse com o mind set indicado para o ler porque cheguei ao fim com a sensação do "soube-me a pouco".
Quem já o leu? O que acharam?

 

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